A vida não é nada perfeita. Então porque esperamos que nossas emoções sejam perfeitas?
Em nossa vida influenciada pelas redes sociais, num mundo obcecado por imagem e ego, todos parecem felizes e positivos o tempo todo. E isso nos faz sentirmos vergonha de sentimentos negativos.
Emoções positivas valem a pena, mas ser constantemente ‘alto astral’ carrega riscos. Sentimentos negativos nos aproximam do nosso íntimo — eles nos conectam com as profundezas do “eu”. Devemos assumir nossas emoções, não apenas as positivas. Estudos mostram que vivenciar e aceitar raiva e tristeza são cruciais para a nossa saúde mental.
“Chega um momento na vida em que a bolha do ego é estourada e você não consegue sentir o chão por muito tempo. Esses momentos em que você não recupera essa estabilidade de jeito algum, são os momentos mais ricos e poderosos de nossas vidas ”. — Pema Chödrön
Uma vida feliz não é uma vida sem sofrimento. Uma vida feliz requer a integração tanto do negativo quanto do positivo que estão dentro de todos nós.
Você é o seu emocional, não apenas o lado bom. Infelizmente, a maioria das pessoas não consegue integrar os dois lados. Uma fraqueza emocional direciona o foco e atenção dessas pessoas nos seus problemas e pontos negativos.
Nossa experiência humana se alimenta do contraste. Não podemos sentir alegria sem tristeza, paz sem raiva e coragem sem medo. Emoções negativas e positivas são dois lados da mesma moeda.
Historicamente, a psicologia se concentrava em consertar. O que já abordava as pessoas com uma visão negativa — a de que os pacientes precisavam ser curados. O sofrimento não era visto como parte do ser humano, mas como uma anomalia. O principal objetivo da psicologia, antigamente, era entender o que havia de errado com as pessoas.
“A atenção quase exclusiva à patologia negligencia o indivíduo.” — Martin Seligman
A felicidade tornou-se o novo santo graal. Essa ênfase excessiva no positivo criou outra narrativa unilateral, o que fez com que as pessoas desenvolvessem um olhar equivocado sobre como lidar com as ‘fraquezas’. Alguns acreditam que eliminar as emoções negativas nos fará sentir positivos. Mas, ao suprimir nossa raiva, medo e tristeza, não resultará em paz, confiança e alegria.
Seligman, o pai da psicologia positiva, encorajou seus colegas a ampliarem seu escopo de trabalho, que consistia em ir além da patologia, para o florescimento humano. Não se trata de eliminar as emoções negativas, mas de ter a proporção certa entre positivas e negativas.
O psicólogo sugere uma proporção de 3 para 1. Embora muitos especialistas questionem se essa é a proporção certa, você já deve ter entendido essa teoria:a de ter um relacionamento saudável entre o negativo e o positivo. Em vez de se concentrar no que está errado com as pessoas e corrigi-las, o foco deve estar em aumentar seus pontos fortes.
Nossa sociedade tem estigmatizado emoções negativas desde sempre. Espera-se que você sinta e pareça perfeito o tempo todo, o que consequentemente adiciona estresse e sofrimento desnecessários. Pessoas deprimidas sentem a necessidade de isolar, como se algo estivesse errado com elas. Suprimir suas emoções é como uma panela de pressão — quanto mais forte você tentar silenciá-los, mais se acumulam, até extravasarem.
Emoções negativas são naturais. O que não é natural é não valorizar seu papel fundamental. Precisamos desenvolver um relacionamento saudável com a negatividade. Escutar, entender e aprender com as emoções “negativas” está no centro do crescimento pessoal.
“Sentimentos desagradáveis são tão cruciais quanto os prazerosos, pois ajudam a entender os altos e baixos da vida. Sem o negativo, não podemos avaliar nossas experiências ou sentir o verdadeiro sentimento de satisfação ” — Tori Rodriguez, psicoterapeuta.
Rodriguez cita diversos estudos que descrevem as consequências positivas de pensamentos e emoções negativas. Ela destaca três principais benefícios:
Primeiro, suprimir nossos pensamentos significa que não podemos avaliar com precisão nossas experiências. Se não podemos aprender com os baixos, também não aproveitaremos os altos da vida.
Em segundo lugar, as emoções negativas são luzes de advertência — elas nos alertam sobre possíveis problemas ou perigo. Eles direcionam nossa atenção para o que precisamos mudar ou resolver, principalmente sobre nós mesmos. Por fim, a supressão de emoções pode prejudicar nosso corpo e causar estresse.
As emoções negativas podem ajudar a iniciar mudanças fundamentais de personalidade. Richard Lazarus, especialista no emocional humano, escreve: “Para o adulto estável, uma grande mudança de personalidade pode exigir um trauma, uma crise pessoal ou uma conversão”.
Elas propiciam o aprendizado, a compreensão de nós mesmos e a sabedoria. A inveja, por exemplo, na dosagem certa, pode inspirar você a trabalhar mais. Um estudo descobriu que a inveja benigna levou os alunos a um melhor desempenho na escola. Quando outra pessoa atinge um objetivo que você gostaria de atingir também, ela pode alimentar seu desejo.
A tristeza pode nos fazer prestar atenção aos detalhes, nos tornamos mais sintonizados com nós mesmos e com o que nos cerca. A ansiedade pode melhorar nossa capacidade de resolver problemas. A raiva pode nos levar à ação, uma reação a uma situação injusta ou indesejada.
Alguns estudiosos acham que colocar todas as emoções em duas caixas — positiva e negativa — não é sábio. Esperança, por exemplo, pode ser positiva, mas também impulsiona a ansiedade excessiva. Precisamos aprender a interpretar todas as nossas emoções, antes de julgá-las.
Alegria e tristeza são dois lados da mesma moeda. Integrar os dois cria um ciclo virtuoso. Nas palavras do psicólogo Francis Weller, “o trabalho de uma pessoa madura é ter gratidão em uma mão e sofrimento na outra, e ser engrandecido por ambas”.
Esse é um dos maiores paradoxos da vida — quanto mais tentamos fugir do sofrimento, mais sofremos. Nós vivemos em uma sociedade movida pelo medo. E temos muito medo das coisas erradas.
Essa é a ideia por trás do livro de Barry Glassner, A Cultura do Medo. Ele explica que nossa sociedade está sendo manipulada por vários medos, a maioria deles em grande parte infundada.
“O uso de anedotas comoventes no lugar de evidências científicas, a romantização de incidentes isolados como tendências, e representações de categorias generalizadas de pessoas são perigosas”.
Uma cultura movida pelo medo só tem a capacidade de enxergar os pensamentos negativos como inimigos. O que faz sentirmos o desejo de nos proteger desses ataques — o que é mais nocivo ainda.
Segundo a monja budista Pema Chödrön, autora do livro Quando Tudo se Desfaz: “Protegendo-nos do sofrimento, estamos sendo gentis com nós mesmos. A verdade é que só nos tornamos mais medrosos, mais endurecidos e mais alienados.
Dividir nossas emoções pode, na verdade, nos separar de nós mesmos: criamos a nossa própria prisão e limitamos nosso potencial. Temos mais medo de confrontar essas emoções do que devíamos — o que nos distancia de superá-las.
Expressar emoções positivas parece mais natural. E é mais fácil porque é socialmente aceito. Compartilhar nossas emoções negativas significa abrir nosso coração — o que requer coragem pois é necessário aceitar nossa vulnerabilidade.
“Destemido” não é aquele que tem ausência de medo. É ser forte o suficiente para confrontar e fazer amizade com nosso medo — transformando nosso inimigo em um aliado.
“Real destemor é um produto da ternura.”- Chogyam Trungpa
Emoções negativas podem ser poderosas se você usá-las como base de dados — elas podem informar suas decisões e alimentar seu poder de ação.
Seu melhor amigo na vida é a sua vulnerabilidade. Emoções negativas podem se tornar uma força para o bem. Toda emoção é uma fonte da sua base de dados, e o caminho de te fazer evoluir.
Texto traduzido e adaptado de Gustavo Razzetti: Publicação original.